Os olhos do homem foram feitos para a glória. Sua alma anseia por algo que valha a pena ver. Este mundo é uma guerra de espetáculos.
O homem é uma criatura vigilante, um admirador nato, um adorador natural. É por isso que ele olha para as estrelas, sobe ao topo das montanhas, explora mundos subaquáticos, viaja para terras novas e indomadas – ele anseia por vistas. Isso explica por que ele paga um bom dinheiro para entrar em arenas esportivas, fica horas olhando para as telas de televisão, presta homenagem ao horizonte flamejante e canta com Adão por o corpo nu de Eva – ele foi feito para ver maravilhas.
Os olhos humanos têm apetite desde o início. Considere a queda de Eva: “Quando a mulher viu que a árvore era boa para se comer e agradável aos olhos …ela tomou do seu fruto e comeu” (Génesis 3:6). Olhos encantados; pecado cometido. O padrão se aplica a ela e aos filhos de Adão. Quando o homem troca a glória de Deus, ele o faz por imagens (Romanos 1:23) – por aquilo que intriga os olhos, algo visto, uma glória trocada.
Vorazes, então, são os olhos do homem. Como a barriga, eles têm fome. Como a garganta, eles têm sede. Como os pés, eles vagam, procurando por algo – qualquer coisa – que valha a pena contemplar. Mas num mundo de imagens, ele ainda não encontrou o que procura. Uma maravilha será substituída por outra e outra. “Sheol e Abadom nunca se fartam, e nunca se fartam os olhos do homem” (Provérbios 27:20).
Mas, oh, quantas vezes a humanidade concebe sua felicidade ao contrário. Pensamos em alcançar, em ser alguém celebrado e reverenciado – isso enche o cálice de ouro com felicidade duradoura. Mas o homem não é cachorro para viver de tapinhas na cabeça. Exatamente o oposto. O homem é uma criatura que olha pela janela através da chuva, procurando algo que o encante. Ver primeiro, não ser visto; principalmente admirar, não ser admirado; fixar o olhar além dos horizontes da terra – essa é a felicidade que poucos encontram.
As costas da Glória
As escrituras testificam que alguns olhos famintos olharam para cima e encontraram o verdadeiro objeto de seu desejo.
Esses escalavam montanhas para exclamar aos céus: “Por favor, mostre-me a sua glória!” (Êxodo 33:18). Essas almas, quando cercadas por perigo e violência, escreveram: “Uma coisa pedi ao Senhor, e a buscarei...contemplar a beleza do Senhor” (Salmos 27:4). Esses olhos voltados para o leste imploravam para ver o que acalmaria sua razão de ser – neste mundo e no próximo. “Quanto a mim, contemplarei a tua face na justiça”, cantou David. “Ao acordar, me satisfarei com a tua semelhança” (Salmo 17:15).
“Mostra-me a tua glória! Satisfaça-me com a sua beleza! Mostre-me seu rosto – mesmo além do túmulo – e tudo estará bem para mim.”
Mas os santos do Antigo Testamento, na melhor das hipóteses, viam apenas o lado de trás da glória divina. Deus diz a Moisés: “Não poderás ver a minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face, e viverá.” (Êxodo 33:20). A única glória que pode satisfazer o desejo insaciável do homem é a glória que o mataria se a contemplasse. Então Moisés se escondeu na fenda, vendo suas costas e ouvindo seu nome, mas não viu o rosto de Deus.
Face da Glória
No entanto, a história não estava acabada. A glória cujo rosto Moisés não podia ver, a beleza fatal demais para os olhos caídos, nasceu no Natal. Maravilha das maravilhas.
Numa pequena cidade chamada Belém chegou o Deus que ninguém jamais tinha visto. O único Deus, que estava eternamente ao lado do Pai – Ele o deu a conhecer (João 1:18). Cristo — “a imagem do Deus invisível”, a luz ofuscante da glória de Deus, “a marca exata de sua natureza”, a própria face da beleza de Deus — tornou-se carne e habitou entre nós (Colossenses 1:15; Hebreus 1:3; 2 Coríntios 4:4–6). “E vimos a sua glória”, escreve o atónito apóstolo, “glória como do Filho unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (João 1:14).
Agora, este Todo-Glorioso desceu até nós, como Moisés desceu da montanha para Israel, velado. Sua glória durante sua encarnação e humilhação foi contemplada não tanto pela visão quanto pela fé. Foi a maravilha dos anjos que o três vezes Santo no trono, possuidor de todas as riquezas e glória, crescesse no mundo dos homens “como uma planta nova e como uma raiz de uma terra seca; não tinha forma nem majestade, para que o olhássemos, nem formosura para que o desejássemos” (Isaías 53:2). O Rei velou sua majestade em carne humana, disfarçou seu esplendor, escondeu seu nome e habitou entre os pobres, doentes e condenados.
Mas os olhos da fé passaram a ver mais do que apenas um judeu. “Bem-aventurado és tu, Simão Bar-Jonas!” Jesus exclama depois que Pedro o identifica como o Cristo. “Porque não foi a carne e o sangue que to revelou, mas meu Pai, que está nos céus” (Mateus 16:17).
No entanto, até mesmo seus discípulos demoraram a vê-lo. Filipe pede a Jesus: “Mostra-nos o Pai, e isso nos basta”. “Há tanto tempo estou convosco”, responde Jesus, “e ainda não me conheces, Filipe?” (João 14:8–9). Então, com peso suficiente para quebrar as costas do mundo, ele profere: “Quem me vê, vê o Pai”. Quando Filipe ouviu as palavras e viu as obras e contemplou a Pessoa nascida em Belém, ele deveria ter visto o rosto daquele que habita na “luz inacessível, a quem ninguém jamais viu ou pode ver” (1 Timóteo 6:16).
Vendo o próprio Céu
Somente a visão de Jesus em toda a sua glória pode satisfazer os olhos dos homens. Ouça a oração de Jesus horas antes da cruz. Ele se inclina para pedir que seus discípulos recebam a joia da coroa do céu. O que é aquilo?
Pai, desejo que também eles, que me deste, estejam comigo onde eu estiver, para verem a minha glória que me deste porque me amaste antes da fundação do mundo.(João 17:24)
Jesus quer que seu povo desfrute da visão que sua alma foi feita para ver: a glória de Deus, brilhando em sua glória, para sempre. Ele o deseja – tanto que pregos nas mãos, nos pés, na alma não o impedirão de obtê-lo. Aqui está algo que vale a pena ver. Aqui está a glória além da hipérbole, disse Thomas Watson.
Eis porque os seres redimidos têm olhos: para ver e saborear Jesus Cristo em sua glória revelada. É por isso que temos bocas: para Lhe cantar louvores sem fim. Em sua presença, a fé fugirá daquele rosto cuja intensidade aposenta o sol: “A cidade não precisa de sol nem de lua para que lhe resplandeçam, porque a glória de Deus a ilumina, e a sua lâmpada é o Cordeiro” (Apocalipse 21:23).
Visão que nos faz felizes
A dor nos olhos dos homens os leva a muitos lugares. Os olhos do homem percorrem as belezas deste mundo, inquietos. Somente aqui, contemplando Jesus — agora pela fé, logo pela visão — encontramos a visão beatífica, a visão que torna eternamente feliz. Onde você está olhando, neste Natal, para satisfazer sua alma?
“Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus” (Mateus 5:8) — você pode imaginar algo melhor? No capítulo final, lemos: “Eles verão a sua face” (Apocalipse 22:4) — existe um final feliz melhor? Esta não é a única alegria que o céu oferece, mas é a melhor. Seu semblante real, não mais oculto, é a consumação do céu tanto para o anjo não caído quanto para o homem redimido.
“Os teus olhos contemplarão o rei na sua formosura” (Isaías 33:17). Não o veremos como era em Belém ou nas ruas de Jerusalém; nós O veremos como Ele é em beleza real (1 João 3:2). Há uma grande diferença, comenta Jeremiah Burroughs, “entre ver o rei num momento comum e vê-lo quando ele está em suas vestes, com sua coroa na cabeça e seu cetro na mão, e colocado sobre o trono, com todos os seus nobres ao seu redor em toda a sua glória” (Moses His Choice, with His Eye Fixed upon Heaven, 537).
E essa visão Dele transfigurado não apenas satisfará, mas transformará. “Amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havemos de ser;mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque o veremos como ele é” (1 João 3:2). Burroughs novamente: “Um homem deformado pode ver um belo objeto, e essa visão não o tornará como aquele belo objeto;mas a visão de Deus tornará a alma gloriosa, como Deus é glorioso” (581–82).
Ao vê-Lo como Ele é, nos maravilharemos com os serafins, gritando santo! e digno! até ameaçarmos explodir de felicidade. Disponível para nós está a Face da glória, não as costas; um olhar eterno em sua beleza, não um vislumbre passageiro. Agora podemos ver em um espelho obscuramente, “mas então veremos face a face”. Agora sabemos em parte; então conheceremos plenamente, assim como também fomos plenamente conhecidos (1 Coríntios 13:12).
Esta é a glória sussurrada no Natal, cantada na Páscoa, gritada na eternidade – a glória profunda o suficiente para saciar nossas almas e nos fazer felizes para sempre.
Artigo original por Greg Morse em : https://www.desiringgod.org/articles/the-starving-eyes-of-man
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